Sexo e afeto

 

Se amo quero ser amada(o).

Se é meu quero mandar eu.

Se vivo quero fazer coisas.

Se é amor, é propriedade, é o “eu” no meu, será?

 

O ser humano é dotado de sentimentos e da capacidade (responsabilidade) de amar. Da comunhão entre o amor e o sexo resulta a plenitude que permite a partilha. Porém, se fruirmos do sexo sem que o amor seja o elo de ligação há uma perda, uma descompensação. Se for no amor que depositamos os nossos esforços estaremos a agregar sentimentos, prazer, afeto e responsabilidade. Mas se em vez disso apenas quisermos depositar o “nosso mundo” no outro, para que este aconteça a partir dele – impondo-nos, ou seja esquecendo-nos de dar e de compreender o outro, então será o nada.

No livro “O Sexo Além da Morte” orientado pelo Espírito André Luiz, obra mediúnica de R. A. Ranieri [1], diz-nos que o sexo e o pensamento são os dois grandes campos de força que se exercitam na nossa mente. Numa das secções mais inesperadas do livro encontramos a explicação sobre como o sexo é percecionado e vivenciado no plano espiritual a partir das sensações sentidas pelos Espíritos. Estes vivem-nas à semelhança do que praticavam quando em vida num corpo, na Terra. Ainda que sejam apenas sensações, pela manutenção da ideação, as consequências sobre o seu espírito são semelhantes.

Naquele contexto o espírito mantém iguais fixações fazendo uso da projeção do pensamento. E entre as diversas faixas vibratórias existentes no plano espiritual há as habitadas por espíritos cuja projeção de pensamentos se mantém nos vícios terrenos, nomeadamente os da cupidez e do sexo (viciado). O livro presta testemunho sobre como é o ambiente espiritual naqueles planos de baixo valor moral. Relata ainda em quais circunstâncias acontecem algumas das visitas àqueles lugares pelo espírito das pessoas que se desdobram do corpo durante o sono  (durante o sono o espírito liberta-se do corpo permitindo que este repouse. Nestas circunstâncias o espírito viaja no plano espiritual em dimensões morais e de vibração magnética afim. A ligação do espírito ao corpo mantém-se pelo designado cordão prateado).

No relato abaixo, Aníbal é o espírito da pessoa que André Luís (espírito) encontra e que era seu conhecido da sua pretérita existência/ vida na Terra. André é o espírito que está a ser conduzido a diversas dimensões do plano espiritual pelo Espírito guia Eleutério (as personagens não são ficcionadas e os relatos e diálogos são factuais e obtidos pelo trabalho mediúnico do autor do livro, R. A. Ranieri).

Assim, no livro “O Sexo Além da Morte”, o Espírito Eleutério diz a Aníbal:

“Sexo, meu filho, não é imundície nem imoralidade. É oportunidade de entendimento entre as criaturas e chance de transfusão de fluidos. Quando duas criaturas se amam verdadeiramente, através do sexo e do ato sexual elas transfundem as vibrações psicofísico espirituais de que são portadoras e dão e recebem energias extraordinárias para a marcha da vida. Há euforia e grandeza moral e espiritual.

Quando, porém, a fixação sexual é demasiada ou exagerada, pode a criatura cair no esgotamento nervoso ou no desgaste e embrutecimento perispiritual, mas apesar disso, perante Deus, não há pecado. Deus que criou o sexo não o fez nem moral nem imoral, fê-lo natural e simples para alegria do homem e da mulher e para progresso dos Espíritos. Sexo é obra divina e o Criador se compraz em verificar que através dele os seres avançam universo adentro ao encontro de maiores possibilidades e alcançam cada dia maior ascensão espiritual. O sexo sublimar-se-á através dos tempos e por ele, os seres que gravitam nas sombras encontrarão o entendimento maior e se aproximarão do Reino de Deus. Você não se lembra de Paulo, o apóstolo?

“Não vos defraudeis uns aos outros porque é melhor casar do que abrasar”. Esse problema é problema velho, mal compreendido pelos homens e mal divulgado por certos padres da Igreja Católica que não puderam entender a orientação dos iniciados e a deturparam. Além disso, você não sabia que Pedro tinha sogra? Quem tem sogra tem ou teve esposa…”.

Não há nada de errado no sexo, mas sim, por vezes, nos nossos atos, que são à imagem do nosso estado de evolução espiritual. Melhorar o primeiro é viver o segundo numa condição que torna tudo mais pleno. Esta realidade é clarividente no relato de André Luiz sobre o seu encontro com Aníbal. André ao perguntar a Aníbal sobre o que este fazia ali, naquela dimensão espiritual, ele responde-lhe que usava o desdobramento no sono para procurar companhias e lugares que lhe satisfizessem os prazeres. Aníbal queixava-se que a sua esposa já não o desejava, pelo que ao se libertar do corpo durante o sono procurava satisfação, apesar de reconhecer a origem viciada dessa busca e a sua fraqueza para a conseguir superar.

Esta passagem do livro revela-nos que durante as horas de vigília (ou seja, quando estamos acordados) conduzimos os nossos pensamentos e comportamento para onde queremos. Se os conduzirmos por ideias serenas e ações éticas é provável a manutenção de companhias afins durante o sono. Mas se essas ideias são viciadas e se acontecem de forma persistente, então é admissível que o espírito ao se libertar da “armadura” do corpo procure no plano espiritual lugares e companhias alinhadas com a sua condição moral ou desejos.

É ainda importante tornar claro que no plano espiritual não há sexo, pois esta prática só é possível pelo corpo físico, tal como se esclarece no item 74 em “O Livro dos Médiuns” de Allan Kardec [2]:

“Nos Espíritos inferiores (seu perispírito) aproxima-se da matéria e é isso que determina a persistência das ilusões da vida terrena nas entidades de baixa categoria, que pensam e agem como se ainda estivessem na vida física, tendo os mesmos desejos e quase poderíamos dizer a mesma sensualidade.”

Kardec [3] acrescenta sobre este assunto, mas no contexto amoroso em que se ligam os espíritos no plano espiritual, que:

“As almas ou Espíritos não têm sexo. As afeições que os unem nada têm de carnal e, por isso mesmo, são mais duráveis, porque fundadas numa simpatia real não são subordinadas às vicissitudes da matéria.”

Diz ainda que:

“Os sexos só existem no organismo. São necessários à reprodução dos seres materiais. Mas os Espíritos, sendo criação de Deus, não se reproduzem uns pelos outros, razão por que os sexos seriam inúteis no mundo espiritual.”

Assim sendo, por que razão os espíritos de encarnados e desencarnados se juntam em determinadas faixas vibratórias?

Primeiro, pela afinidade que os junta. Sendo os laços resultado da afinidade magnética (vibratória) entre aqueles, estes juntam-se por terem comportamentos morais semelhantes.

Segundo, face ao que foi referido e aos relatos obtidos (a partir de trabalhos mediúnicos) por parte de Espíritos atormentados pelas suas sensações sexuais, percebe-se que aqueles laços se mantêm, também, quando os espíritos se encontram no plano terreno, o que reforça a ideia das afinidades magnéticas – ligando espíritos encarnados e desencarnados por via do pensamento e das sensações. E é por esta razão que há interferência na vida dos encarnados, por exemplo, quando estes praticam sexo de forma desregrada, ou seja, desprovido de afeto. Neste contexto, os espíritos desencarnados comportam-se como vampiros da sexualidade dos encarnados imprevidentes. Aqueles, impossibilitados de saciarem a libido da sua projeção mental viciada acoplam-se magneticamente às pessoas (aos espíritos dos encarnados) que lhes são próximos moralmente. Em suma, aproximam-se de casais que lhes alimentam o desvio moral. Casais que em consequência de uma sexualidade desregulada permitem a aproximação destes espíritos que lhes absorvem as emanações psíquicas libertadas durante a relação sexual [4].

Se o objetivo da vida é o amor será o sexo escusado?

Não, pois o sexo está na natureza porque Deus o concebeu como algo natural, pelo que não é escusado.

E por que razão se obtém prazer do sexo?

Se assim não fosse a reprodução da humanidade, que é o garante do ciclo reencarnatório, poderia estar em perigo. De facto, se o sexo fosse algo de chato ou sujo, este seria provavelmente rejeitado pelo ser humano. Isto reflete o quão equilibrada é a obra da Criação ajudando-nos a compreender que o prazer é natural à própria condição humana servindo, ainda, à sua reprodução.

Neste contexto, como encarar o celibato?

Pela leitura do livro “O Sexo Além da Morte” compreende-se que ainda não estamos num estado de evolução capaz para viver naturalmente em celibato. O Espírito André Luiz refere que dado o nosso estado evolutivo o celibato não é “esperado” por Deus. De facto, essa opção pode ser contraproducente e ser uma distorção à ordem natural da vida. Talvez por isto seja enormemente difícil para quem o intenta.

A este propósito o Espírito Eleutério (personagem do livro “O Sexo Além da Morte”) refere:

“O sexo não é empecilho à evolução. Pelo contrário, é porta aberta para a evolução. Não é através da reencarnação que os Espíritos vão alcançando maior progresso? O sexo é porta sagrada. A extravagância sexual é que enfraquece o corpo físico e o perispírito do homem. As forças eletromagnéticas dos veículos corpo e perispírito tendem a enfraquecer-se ou a gastar-se com o exercício indiscriminado da sexualidade, apenas isso… É como se uma bateria se descarregasse pelo uso excessivo.

O cérebro material sem a carga eletromagnética necessária, enfraquecido, não tem condições de alçar voos para o pensamento mais alto. Daí terem os religiosos do passado caído na situação oposta e absurda de tentar a castidade absoluta. Para se manter uma absoluta castidade, também é necessário que o ser tenha progresso e evolução espiritual. A castidade para o homem comum ou mesmo para aquele que progrediu muito espiritualmente, mas ainda não alcançou a beatitude é medida prejudicial porque a criatura encarnada tem a responsabilidade da criação das formas…”.

O sexo, que nos parece ser apenas do domínio do corpo (e das suas ditas necessidades), é, na verdade, do domínio do espírito, pois deriva da expressão da sua vontade, dos sentimentos por ele burilados e, assim, do pensamento produzido e expresso pelo coração. Por conseguinte, é o afeto que satisfaz as ditas necessidades, que nos tolhem ou põe em busca. E se o amor elimina o sentido de posse pelo outro para que no seu lugar se coloque a responsabilidade e  afeto, então sejamos maestros dessa orquestra que tem na partitura os nomes das pessoas a quem nos ligamos.

Referências

[1] RANIERI, R. A., O Sexo Além da Morte. Orientado pelo Espírito André Luiz, Editora da Fraternidade.

[2] KARDEC, Allan, O Livro dos Médiuns. [3] KARDEC, A., Revista Espírita. Janeiro de 1866, pp. 15-16. Recuperado de http://www.febnet.org.br/ba/file/Downlivros/revistaespirita/Revista1866.pdf.

[4] Recuperado de http://www.oconsolador.com.br/ano4/170/ricardo_baesso.html.