O gene de Deus

 

Dean Hamer, pesquisador na área da genética, refere no seu livro “O Gene de Deus” que crer em Deus é um fenómeno genético e que ter uma religião é um fenómeno sociológico. Hamer e sua equipa constataram que o nosso DNA possui cerca de trinta e cinco mil genes – quando se pensava serem cem mil – tendo sido um desses genes definido como gene de Deus: o designado VMAT2. [1]

 

A ciência tem feito progressos notáveis conducentes à explicação da nossa realidade física e psíquica, tal como ilustra o trabalho de Dean Hamer e da sua equipa no domínio da genética. Porém, no seio da comunidade científica mantém-se uma barreira de separação entre o que se diz ser da ciência daquilo que se diz ser das religiões. Ao estudarem mais de dez mil gémeos idênticos, a equipa de Hamer ajudou a clarificar um importante dado sobre esta dicotomia.

No livro “O Gene de Deus” Hamerafirma que a crença em Deus é um fenómeno genético, pelo que há uma predisposição orgânica para a aceitação da ideia sobre a existência de Deus. Assim sendo, todos nós estamos geneticamente preparados para compreender Deus, pelo que a aceitação da Sua existência não é resultado da prática religiosa numa dada religião. Esta prática é um fenómeno sociológico e pode conduzir à reflexão sobre as realidades de Deus, mas não é a causa da crença em Deus. O cientista distingue a crença do fenómeno sociológico das religiões.

A prática religiosa é um exercício exterior que ritualiza uma relação entre Deus e o Homem. Todavia, aquela relação existe desde logo de forma genética, pelo que é independente do facto de se ser praticante de dada religião ou de se ser religioso. Por sua vez, a relação com Deus alcança-se por via da harmonia de pensamentos e sentimentos para com outros, mas também consigo mesmo, pelo que não necessita de um templo de oração, mas sim da cultura de uma consciência fraterna, solidária e indulgente, e liberta de culpa ou medo.

As religiões e os seus religiosos têm um papel relevante, mas não exclusivo no que toca à relação entre as pessoas e Deus. Afinal, cada um é o seu próprio médium. Somos o gestor da nossa Fé, pelo que não carecemos de intermediários. Somos nós que temos de assumir essa responsabilidade. Carecemos sim é de educação e oração. A educação liberta-nos da ignorância e a oração ajuda-nos a conquistar a harmonia. Todos somos convidados à oração desde sempre e muita antes das religiões o solicitarem, pois na nossa consciência está escrita a lei de Deus tal como mencionado na questão 621 de “O Livro dos Espíritos”.

Jesus referiu-se de forma interrogativa a essa centelha divina que reside em cada um:

Não está escrito que vós sois deuses? Portanto, podeis fazer tudo que eu faço e muito mais, se quiserdes.”

É importante que desenvolvamos esse Deus interno pela harmonia e fidelidade ao nosso propósito íntimo (a fé), que nos ajuda a ajustar energias para vencer os nossos desafios (provas e expiações). Afinal, ainda confiamos pouco nas capacidades que temos para progredirmos fazendo o bem.

Allan Kardec estabeleceu que Fé inabalável só é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade. Para sermos capazes de vivenciar essa realidade, ou seja, compreender Deus, raciocinando, não basta fazermos uso do nosso intelecto. É necessário adicionar um sentido que é a intuição (pergunta 10 de «O Livro dos Espíritos»), a qual vem do amor vivenciado no quotidiano. “Bem-aventurados os puros de coração porque verão a Deus” (Mateus cap. 5 vers. 8).

Tal como esclarece Divaldo Pereira Franco, numa psicografia de Bezerra de Menezes, em novembro de 2014, “estamos a caminho da intuição, após a conquista da razão” [3], ou seja, a intuição é o instrumento de apoio ao raciocínio e de apuro das dimensões intelectivas sensíveis. A intuição fortalece a cognição para lá dos domínios associados à racionalidade (o dito QI). É tal como refere o filósofo chinês Lau Tsé (séc. IV a.C.): “para ganhar conhecimento, adicione coisas todos os dias. Para ganhar sabedoria, elimine coisas todos os dias” [idem].

A própria física quântica introduz uma nova visão sobre o mundo e sobre a compreensão de Deus. Por ela compreende-se de forma ainda mais profunda que tudo na natureza está interligado e tudo o que vemos e entendemos como objectos separados se unem numa grande rede, num campo quantizado, tal como colocado pelo professor e filósofo Huberto Rhoden: “Se o átomo não estivesse impregnado da presença divina, nem o átomo seria átomo, nem Deus seria Deus”. Uma conceção da realidade, interligada e harmonizada por Deus, que já tinha sido referida pelos Espíritos a Kardec: “A Natureza inteira está mergulhada no fluido divino” (capítulo II do livro «A Génese», itens 22, 23 e 24).

Tudo se interliga e se concretiza na nossa mente a partir da interpretação a que estamos habilitados a realizar. Um exemplo disto é o sentimento de justiça, o qual é inato (pré-existente) no ser humano. Porém, a ignorância sobre a continuidade da vida faz-nos pensar na justiça terrena como sendo a única forma desta se concretizar. Sobre isto Jesus testemunhou a base da verdadeira Justiça, dizendo: “Queira cada um para os outros o que quereria para si mesmo”. Esta frase simples pode ser válida a partir de diversos matizes. Contudo, se a nossa capacidade de interpretar as leis de Deus a partir dos ensinamentos de Jesus estiver desenvolvida o suficiente, então poderemos perceber que aquela frase inclui o que Deus imprimiu no coração do Homem. Ela contém a regra da verdadeira justiça fazendo com que cada um deseje para o outro o respeito dos seus direitos, pois, em condições normais, ninguém deseja o próprio mal.

A justiça concretiza-se nas leis de Deus e nós somos o meio para a sua execução. Por isso, não percamos tempo na busca da justiça que está para lá do ser humano. Centremos antes o nosso tempo na dádiva. Se assim suceder deixa de haver espaço para a injustiça e viveremos então de forma inteligente.

O ganho de consciência sobre a nossa natural religação a Deus ajuda a desmistificar a nossa ligação com a religião. A religião é uma instituição humana para explicar o Deus criado pelos homens. Porém, Deus é o criador do Homem, pelo que a sua centelha estará nos nossos genes. Mas, não confundir esta informação genética com aquela que se julga ser herança dos pais.

Se vivemos vidas sucessivas, reencarnando, a informação genética herdada não advém dos pais, mas sim de nós mesmos. Essa informação é transportada pelo perispírito – corpo fluídico, ou semi-material, que liga o espírito ao corpo físico. Após a morte do corpo a informação sobre o desenvolvimento moral, danos e benefícios deixados no corpo e na psique, são mantidos pelo perispírito, que a transporta para a reencarnação posterior. Essa informação é então transmitida ao novo corpo físico.

Neste sentido, o Espiritismo, entendido como o Consolador prometido por Jesus, esclarece a noção de divino como manifestação de Deus pelas leis morais que regem a vida dos Espíritos, sendo a Providência Divina a ação do Criador na criação. Kardec, no livro “A Génese” refere:

“A providência é a solicitude de Deus para com suas criaturas. Deus está em toda parte, tudo vê e tudo preside, mesmo às coisas mais insignificantes. É nisto que consiste a ação providencial” [4], que igualmente se manifesta nos nossos genes.

 

Referências

[1] Recuperado de http://www.divaldofranco.com.br/mensagens.php?not=113

[2] Racionalidade e intuição (comunicação de Bezerra de Menezes), recuperado de http://www.souleitorespirita.com.br/reformador/destaque/momento-decisivo/

[3] Lau Tsé, recuperado de https://pt.wikipedia.org/wiki/Lao_Zi

[4] KARDEC, Allan, A Génese, Hellil, 2018.

Título: A Génese